sábado, 19 de abril de 2025

Registro Botânico 4: Magnolia grandiflora

    Algumas plantas sempre chamam minha atenção. Elas se revelam aos poucos. A magnólia é assim: elegante, silenciosa, cheia de presença. Vale a pena ser descoberta com calma. Por isso, escolhi começar alguns esboços como um desafio, não apenas por sua beleza evidente, mas também pela complexidade delicada de sua estrutura.


  
  No canteiro cetral da Avenida Coronel Heráclito dos Santos, Jardim das Américas em Curitiba, caminho para o meu trabalho, há uma fileira de magnólias. Então, no final de março e começo de abril, notei que apareceu um tipo de fruto aveludado, com cores entre o rosado e o verde. Pesquisando no internet, descobri que se trata de um conjunto de folículos com aspecto semelhante a uma pinha. Coletei uma para desenhar e com isso conhece-la melhor. Após alguns dias, a estrutura  secou e se rompeu, liberando as sementes vermelhas que estavam em seu interior.


    Esse estudo da magnólia ainda está em andamento, mas já me ensinou algo. E acho que é isso que me fascina na ilustração científica: ela é, uma maneira de aprender a ver.

Registro Botânico N° 4: Estudos gerais

Magnólia (Magnolia grandilora)
Local: Avenida Coronel Heráclito dos Santos. Bairro Jardim das Américas, Curitiba Paraná

Estudo número 4: Técnica desenho lápis grafite em papel


domingo, 13 de outubro de 2024

A Complicada Arte de Ver

    Ela entrou, deitou-se no divã e disse: "Acho que estou ficando louca". Eu fiquei em silêncio aguardando que ela me revelasse os sinais da sua loucura. "Um dos meus prazeres é cozinhar. Vou para a cozinha, corto as cebolas, os tomates, os pimentões - é uma alegria! Entretanto, faz uns dias, eu fui para a cozinha para fazer aquilo que já fizera centenas de vezes: cortar cebolas. Ato banal sem surpresas. Mas, cortada a cebola, eu olhei para ela e tive um susto. Percebi que nunca havia visto uma cebola. Aqueles aneis perfeitamente ajustados, a luz se refletindo neles: tive a impressão de estar vendo a rosácea de um vitral de catedral gótica. De repente, a cebola, de objeto a ser comido, se transformou em obra de arte para ser vista! E o pior é que o mesmo aconteceu quando cortei os tomates, os pimentões... Agora, tudo o que vejo me causa espanto." Ela se calou, esperando o meu diagnóstico. Eu me levantei, fui à estante de livros e de lá retirei as "Odes Elementales", de Pablo Neruda. Procurei a "Ode à Cebola" e lhe disse: "Essa perturbação ocular que a acometeu é comum entre os poetas. Veja o que Neruda disse de uma cebola igual àquela que lhe causou assombro: 'Rosa de água com escamas de cristal'. Não, você não está louca. Você ganhou olhos de poeta... Os poetas ensinam a ver". Ver é muito complicado. Isso é estranho porque os olhos, de todos os órgãos dos sentidos, são os de mais fácil compreensão científica. A sua física é idêntica à física óptica de uma máquina fotográfica: o objeto do lado de fora aparece refletido do lado de dentro. Mas existe algo na visão que não pertence à física. William Blake sabia disso e afirmou: "A árvore que o sábio vê não é a mesma árvore que o tolo vê". Sei disso por experiência própria. Quando vejo os ipês floridos, sinto-me como Moisés diante da sarça ardente: ali está uma epifania do sagrado. Mas uma mulher que vivia perto da minha casa decretou a morte de um ipê que florescia à frente de sua casa porque ele sujava o chão, dava muito trabalho para a sua vassoura. Seus olhos não viam a beleza. Só viam o lixo. Adélia Prado disse: "Deus de vez em quando me tira a poesia. Olho para uma pedra e vejo uma pedra". Drummond viu uma pedra e não viu uma pedra. A pedra que ele viu virou poema. Há muitas pessoas de visão perfeita que nada veem. "Não ser cego não basta para ver as árvores e as flores. Não basta abrir a janela para ver os campos e os rios", escreveu Alberto Caeiro, heterônimo de Fernando Pessoa. O ato de ver não é coisa natural. Precisa ser aprendido. Nietzsche sabia disso e afirmou que a primeira tarefa da educação é ensinar a ver. O zen-budismo concorda, e toda a sua espiritualidade é uma busca da experiência chamada "satori", a abertura do "terceiro olho". Não sei se Cummings se inspirava no zen-budismo, mas o fato é que escreveu: "Agora os ouvidos dos meus ouvidos acordaram e agora os olhos dos meus olhos se abriram". Há um poema no Novo Testamento que relata a caminhada de dois discípulos na companhia de Jesus ressuscitado. Mas eles não o reconheciam. Reconheceram-no subitamente: ao partir do pão, "seus olhos se abriram". Vinicius de Moraes adota o mesmo mote em "Operário em Construção": "De forma que, certo dia, à mesa ao cortar o pão, o operário foi tomado de uma súbita emoção, ao constatar assombrado que tudo naquela mesa - garrafa, prato, facão - era ele quem fazia. Ele, um humilde operário, um operário em construção". A diferença se encontra no lugar onde os olhos são guardados. Se os olhos estão na caixa de ferramentas, eles são apenas ferramentas que usamos por sua função prática. Com eles vemos objetos, sinais luminosos, nomes de ruas - e ajustamos a nossa ação. O ver se subordina ao fazer. Isso é necessário. Mas é muito pobre. Os olhos não gozam... Mas, quando os olhos estão na caixa dos brinquedos, eles se transformam em órgãos de prazer: brincam com o que veem, olham pelo prazer de olhar, querem fazer amor com o mundo. Os olhos que moram na caixa de ferramentas são os olhos dos adultos. Os olhos que moram na caixa dos brinquedos, das crianças. Para ter olhos brincalhões, é preciso ter as crianças por nossas mestras. Alberto Caeiro disse haver aprendido a arte de ver com um menininho, Jesus Cristo fugido do céu, tornado outra vez criança, eternamente: "A mim, ensinou-me tudo. Ensinou-me a olhar para as coisas. Aponta-me todas as coisas que há nas flores. Mostra-me como as pedras são engraçadas quando a gente as têm na mão e olha devagar para elas". Por isso - porque eu acho que a primeira função da educação é ensinar a ver - eu gostaria de sugerir que se criasse um novo tipo de professor, um professor que nada teria a ensinar, mas que se dedicaria a apontar os assombros que crescem nos desvãos da banalidade cotidiana. Como o Jesus menino do poema de Caeiro. Sua missão seria partejar "olhos vagabundos"... 


Rubem Alves – Educador e escritor.

sábado, 12 de outubro de 2024

As Árvores Parte 2

Técnicas de ilustração inspiradas pela natureza

    Após conhecer o livro O Livro das Árvores dos Ticuna, senti a necessidade de aprofundar a reflexão sobre a forte conexão entre as comunidades indígenas e a natureza, especialmente no que diz respeito à preservação das florestas e ao seu valor cultural. A leitura me inspirou a levar essa consciência para o cotidiano de meus alunos, promovendo atividades que os conectam mais profundamente com o ambiente natural ao nosso redor.



     Assim como os Ticuna, que valorizam as árvores não apenas por sua importância física, mas também por seu significado simbólico e espiritual, quis que meus alunos experimentassem essa visão durante nossas aulas. Através de atividades de observação e criatividade, incentivamos cada um deles a olhar para a natureza com curiosidade, imaginação e respeito.

    A seguir, compartilho alguns dos desenhos feitos pelos alunos, que expressam suas percepções da natureza ao seu redor. Esses trabalhos refletem a diversidade de olhares e a sensibilidade das crianças ao interagir com o meio ambiente, nos fazendo lembrar que preservar a natureza é, acima de tudo, uma forma de preservar a vida e a cultura, como os Ticuna tão bem demonstram em suas memórias e tradições.

    Duas novidades nos jardins das Casas da Leitura ganharam destaque pelos olhos das crianças:

  Esses temas são realmente incríveis! O acasalamento das borboletas pode levar as crianças a aprender sobre os ciclos de vida e a beleza da transformação nas fases das borboletas. Já o casal de curicacas pode despertar curiosidade sobre a vida das aves, seus hábitos e o ambiente em que vivem.

    O contato com ambientes naturais oferece oportunidades para a exploração do mundo de forma ativa e interativa, estimulando o pensamento criativo e o desejo de descobrir. A natureza é rica em formas, cores, texturas, sons, cheiros que despertam na criança a vontade de explorar o ambiente, assim, desenvolvem a coordenação motora e a criatividade. Além dos efeitos calmantes que ajudam a criança a relaxar e a se concentrar.

    Uma ótima oportunidade para discutir sobre ecologia, comportamento animal e a importância da biodiversidade!

segunda-feira, 30 de setembro de 2024

Oficina Impressões Indígenas



No último sábado, 28 de setembro de 2024 a Oficina Impressões Indígenas foi um sucesso. A iniciativa aconteceu na Casa da Leitura Vladmir Kozák, situada no bairro Uberaba em Curitiba, atraindo um público curioso, empolgado e pronto para compreender mais profundamente as tradições artísticas indígenas.

Durante a oficina, os participantes adquiriram habilidades para usar tintas naturais na criação de grafismos. A experiência prática permitiu que todos criassem uma ligação especial com os elementos da natureza. Além disso, o encontro foi marcado pela troca de conhecimentos e pela valorização das expressões culturais. As avaliações foram positivas, recebendo elogios pela oportunidade de experimentar novos métodos artísticos. 

Agradeço a todos que participaram e contribuíram para o sucesso desse evento, em especial ao Carlos Vinícius Ziolkoski responsável pela Casa da Leitura Vladimir Kozák, Terezinha Lima da Associação Theco do Brasil e também a Josiane Santana, Coordenadora do Centro Cultural Casa Kozák

Estou ansiosa para mais encontros como este. 💖

quinta-feira, 12 de setembro de 2024

As Árvores Parte 1

           Vocês conhecem "O LIVRO DAS ÁRVORES"?    

Você pode baixar o livro em PDF clicando na imagem acima, ele está em Domínio Público.

Na apresentação do livro, Jussara Gomes Gruber, explica que os professores ticuna perceberam que a escola precisava trabalhar em um plano de conservação dos recursos naturais mais específico nas áreas já demarcadas. Isso no ano de 1987. Eles decidiram dividir o material levantado em áreas específicas e publicar o primeiro livro da série, O livro das Árvores. Como resultado, este livro explica a forte e rica relação que os Ticuna têm com as árvores que formam a floresta, destacando o valor e a importância de várias espécies, principalmente as nativas, para a sobrevivência física e cultural. Embora não seja um livro de botânica, é uma memória das árvores que permite aos Ticuna lembrar o valor de cada uma delas em sua vida. Examinando as páginas, você compreende os motivos que os levam a proteger e preservar suas florestas, um patrimônio que deve ser transmitido de pai para filho como uma herança das mais belas e ricas. O livro acolhe a perspectiva dos Ticuna sobre a natureza que os cerca e lhes serve de morada, trazendo textos e imagens que sustentam suas ideias sobre o mundo real e imaginário, numa linguagem que combina conhecimentos práticos, valores simbólicos e inspiração poética. Com exceção de dois dos desenhos aqui apresentados, todos foram criados individualmente. Por outro lado, os textos são produtos de uma criação coletiva, baseada em conhecimentos de domínio também coletivos. Este livro é principalmente dirigido a crianças e adolescentes que estudam nas escolas Ticuna. No entanto, seria crucial que as crianças não índigenas em muitas escolas do país também o leiam. Elas teriam a oportunidade de conhecer os Ticuna, contemplar seus desenhos e aprender sobre a floresta amazônica com a palavra de seus antepassados.
A partir do conhecimento e leitura do livro, decidi tirar algumas fotos das árvores que fazem parte do meu cotidiano. Penso em breve incluir aqui nessa postagem alguns desenhos também.

Casa da Leitura Nair de Macedo

                                      

Uma Araucária

Tenho muita sorte de trabalhar em locais com muitas árvores. As duas imagens acima foram registradas na Casa da Leitura Nair de Macedo, local onde dou aulas de ilustração todas as quintas-feiras. O clima é sempre agradável ao longo do dia, e o canto dos pássaros confere uma beleza única ao local.

A Casa da Leitura Vladmir Kozák, onde ministro aulas todas as segundas-feiras, segue abaixo. Observe o jardim repleto de árvores de grande porte e o gramado onde podemos apenas permanecer e contemplar.


UFPR - Campus Centro Politécnico, onde faço o Aperfeiçoamento em Ilustração Científica e também colaboro com criações de ilustrações para o Departamento de Ciências Biológicas. Programa Paraná Faz Ciência junto a Fundação Araucária.


A seguir, a perspectiva da janela da sala onde trabalho em minha residência. Há uma pitangueira na frente, um araçazeiro, dois pés de limão, um de café. Também temos agora, dois novos Ipês Amarelos que a Prefeitura plantou em quase todas as ruas da região do Capão da Imbuia, em compensação aos cortes feitos nas obras da Avenida Victor Ferreira do Amaral no Tarumã.💖


A seguir, alguns desenhos que os alunos desenvolveram com a temática. No post "As Árvores parte 2".